Educação Geral

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EDUCAÇÃO DO FUTURO E GRATUITA| 42, a escola que é um negócio social a serviço da formação de human coders

Por Guilherme Décourt

Guilherme Décourt

Uma projeção do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp) aponta que 484 mil estudantes devem deixar as faculdades e universidades particulares do Brasil por não conseguir pagar as mensalidades. Com inadimplência e evasão crescente – como reflexo do impacto da pandemia na Educação – 30% das instituições de ensino superior do país podem fechar em 2020, já que o atraso nas mensalidades cresceu 72,4% e a desistência dos alunos aumentou 32,5%. Grande parte dos alunos que se encontram nessa situação credita o problema à empregabilidade; na prática, a perda de emprego do próprio aluno ou de familiares que custeavam os estudos inviabiliza a conclusão do curso.

Em todo o mundo, vivenciamos uma situação limite na educação superior, caracterizada por um processo de endividamento de jovens. Nos Estados Unidos, o total da dívida federal dos estudantes atingiu US$ 1,6 trilhão em 2020 – valor superior ao Produto Interno Bruto (PIB) da Espanha. Embora a média de endividamento educacional seja US$ 34 mil, o número de estudantes que passaram dos US$ 100 mil atingiu 3,2 milhões nesse ano. Ou seja, estamos diante de uma bomba-relógio. De um lado, o futuro do trabalho demanda profissionais cada vez mais preparados para novas tecnologias e para a complexidade de um mundo em rápida transformação; de outro, há um verdadeiro colapso no modelo de negócio da educação.

Repensar a aprendizagem e a relação entre educação e empregabilidade. E, também, a maneira de estruturar o financiamento de uma nova geração de profissionais altamente capacitados. Essa demanda está sendo cumprida por um negócio social. A 42 – escola surgida, em 2013, na França com o objetivo de oferecer uma alternativa educacional que pode formar pessoas com escala e alta qualidade, de maneira a estarem preparadas para serem protagonistas no mundo digital. Ao longo do tempo, esse objetivo foi evoluindo; hoje, a ambição da 42 é ser a maior rede para formação de human coders no mundo. Ou seja, o ser humano no centro do processo; em vez de seguir linguagens “da moda”, o programa da 42 foca em uma sequência lógica que desenvolve 17 habilidades de longa duração. Essas habilidades também têm o mesmo elemento fundamental: adaptabilidade pessoal, aprendizado, enfrentamento e solução de novos desafios que os formandos encontrarão no cotidiano profissional.

No Brasil há exatamente um ano, a escola foi viabilizada com a parceria estratégica da Fundação Telefônica e do Itaú Social, além do apoio do Grupo Ultra. Para os alunos, a 42 é totalmente gratuita e voltada a formar Engenheiros de Softwares. O Brasil enfrenta um sério déficit de profissionais qualificados na área. De acordo com a Softex, estima-se que existem, hoje, 250 mil vagas de trabalho que não são preenchidas por falta de profissionais e este número deverá subir para 408 mil vagas em 2022. Diante desse desafio e enorme potencial, a 42 tem sido, nesse primeiro ano de atuação, um vetor importante de transformação. A unidade São Paulo abriu o processo de seleção de estudantes (que chamamos de cadetes) há exatos 12 meses: foram 12 mil inscritos em um único mês. Hoje, temos 128 participantes, estudando remotamente, por conta da pandemia. Em situações normais, a escola funciona 24 horas por dia, sete dias por semana. Ou seja, o aluno conduz o próprio horário e a própria formação.

Nesse primeiro ano, conseguimos atrair um público diverso e nos tornarmos o primeiro país – a 42 está presente em 25 países – a implementar um sistema de bolsa auxílio para pessoas que estão em situação de vulnerabilidade. Muitas vezes, o gratuito ainda é caro, por isso, buscamos recursos e conseguimos apoiar 25% dos nossos cadetes até o sexto mês de programa, quando em geral, já estarão prontos para o primeiro passo no mercado de trabalho. Era fundamental garantir apoio financeiro para que os alunos das periferias seguissem evoluindo no currículo.  

Fundamentada em inovação pedagógica, a 42 implementou – no período de distanciamento social – intensas adaptações; como resultado, obtivemos grandes aprendizados conectadas com o novo futuro que está emergindo. Nossa perspectiva é similar a destacada pelo relatório Three ways the coronavirus pandemic could reshape education, Fórum Econômico Mundial; vemos que as mudanças na sociedade irão aumentar à velocidade de surgimento de modelos híbridos, com atividades presenciais e remotas em paralelo. E já estamos fazendo testes importantes neste sentido, no nível global, com a 42 Network. 

O fato de sermos um modelo peer-to-peer permite rápidas adaptações e uma construção em conjunto com os alunos. Partimos de um questionamento profundo sobre o que faz a parte presencial da nossa experiência ter valor. Ainda é cedo para apontar para um modelo específico, mas os sinais positivos nos deixam confiantes de que estamos no caminho certo e distantes dos problemas relatados no início desse artigo. Fatores importantes no nosso modelo – que permitem escalar a oportunidade para quem quer aprender tecnologia –, residem em sermos gratuitos e não exigirmos escolaridade. Muita gente enfrenta desafios financeiros ou de falta de um histórico escolar. A 42 tem um processo rigoroso, mas que avalia o indivíduo pela lógica e resiliência – e, ao mesmo tempo – sem a barreira financeira, que muitas vezes é enorme. 

A 42 oferece um modelo educacional que ganhou notoriedade internacional por ser muito eficiente no preparo dos alunos com habilidades-chave para o mundo digital, como aprender a aprender, colaborar em ambientes diversos e resolver problemas complexos. Por ser uma rede global no qual os alunos também participam da evolução do ensino, hoje existem milhares de pessoas em mais de 30 campi construindo a 42 – e isso nos traz uma alta capacidade de inovação e adaptação ao mundo digital. Neste modelo a pessoa aprende de maneira direta a construir softwares, mas a partir daí as possibilidades de desenvolvimento pessoal e de impacto são quase que infinitas.

Nosso objetivo imediato é que o modelo tenha impacto na formação de profissionais preparados para serem líderes na área digital no Brasil – seja por meio do empreendedorismo, ou por meio da atuação em empresas estabelecidas. Buscamos tornar o país um importante centro de contribuição para a formação e evolução da rede internacional da 42.

Sobre o autor:

Guilherme Décourt atuou por 10 anos como venture capitalist na Monashees, sendo responsável pelos investimentos do fundo na área de SaaS. Atualmente, lidera a operação da 42 São Paulo, uma escola de programação gratuita com modelo de ensino inovador. Graduado em Engenharia Civil pela Unicamp.

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