Especialistas revelam o outro lado da Inteligência Artificial usada em plataformas de recrutamento
A experiência em larga escala desmitifica a credibilidade de sistemas de seleção online.” É o que afirma Lucas Rana, sócio-diretor da Dinâmica Treinamentos, empresa com foco em ativação de performance para quem busca entrar no mercado de trabalho e alavancar a carreira, que desde 2012 atua com treinamentos para os processos seletivos empresariais mais difíceis e concorridos e detém a marca de mais de 5.000 alunos treinados.
“São ferramentas que já testamos inúmeras vezes e detectamos as falhas. Para citar um exemplo, no preenchimento do cadastro, basta usar palavras-chave condizentes com a vaga pretendida que serão mapeadas pelo algoritmo e mesmo que o texto não faça sentindo, a candidatura será validada à próxima fase”, alerta Rana.
O especialista afirma que não adianta o candidato se preocupar em descrever a experiência da maneira mais interessante, se não houverem os termos corretos no texto, pois o robô não irá detectar. “Por isso, orientamos os nossos alunos com as melhores técnicas para combinar a narrativa da experiência com o que os algoritmos esperam captar”, diz Rana.
A Inteligência Artificial (AI) vem crescendo e na última década surgiram diversas aplicações como chatbots, robôs, sistemas de reconhecimento de voz, entre outros. Segundo Rana, essa tecnologia vem atraído os olhares dos investidores, principalmente fundos americanos como Ycombinator, NEA, e Intel capital. Nessa onda, grande parte de empresas com base em IA utilizam tecnologias de AIaaS (Inteligência Artificial como Serviço). Gigantes da tecnologia possuem soluções nesse modelo de AIaaS, como IBM watson, Google Brain, AWS, Alexa e Amazon Go, a principal função é oferecer tecnologia de ponta integrada à IA para empresas criarem suas plataformas e aplicações sem a necessidade de uma grande infraestrutura e custo elevado.
Dentre as infinitas aplicações da IA, destacam-se as inseridas no processo seletivo de RH por meio das plataformas de recrutamento e seleção. “Muitas empresas estão adotando a utilização de plataformas para acelerar os trâmites principalmente de processos seletivos de estágio e trainee, já que geralmente são centenas ou milhares de candidatos por vaga. Mas será que essas plataformas são assertivas? Medir o sucesso da implantação apenas por redução do tempo de contratação e “retenção” dos contratados na empresa será sinônimo de sucesso?”, enfatiza ele.
Neste sentindo, os especialistas da Dinâmica Treinamentos elencaram os principais desafios na melhoria das plataformas de recrutamento e seleção:
#1 Machine Learning (aprendizado de máquina) como vilão
A principal base da IA é o machine learning, ou aprendizado de máquina, cuja principal função é aprender com os dados, fazer correlações e ajudar a tomada de decisão fazendo milhares de conexões em poucos segundos. Em plataformas de recrutamento a aplicação do machine learning acontece desde o contato inicial dos recrutadores, que manipulam a plataforma, até as etapas finais de contratação, em que precisam alimentar o sistema para que aprenda qual o perfil de candidato desejado. “Faz muito sentido encontrar padrões e recrutar pessoas com perfis próximos de talentos contratados recentemente, mas na prática o que acontece quando um dos principais critérios de seleção nas etapas online são testes de lógica (TERP) e idioma (talent up) é uma falha grave. Não há nenhuma trava (ou quase nenhuma) ou impedimento para que candidatos burlem o processo e façam provas online em grupo, acompanhados dos amigos que irão ajudar nas respostas”, indica Rana.
Pela experiência, o aprendizado de máquina começa a entender que o melhor tipo de candidato é este, os que possuem ótimas notas em testes. E este é o perfil típico dos que realizaram os testes em grupo.
Para ilustrar isso, imagine um candidato X que realizou os testes sozinho (como deveria ser) e tirou nota 80 de 100. Lado a lado, um outro candidato Y realizou o mesmo teste com um grupo de 4 pessoas e tirou uma nota 90 de 100. Estatisticamente é desleal fazer uma avaliação de performance, já que fizeram os testes em situações distintas.
Segundo a equipe da Dinâmica Treinamentos, alimentar um sistema de machine learning com dados errados faz com que a plataforma aplique regras equivocadas, trazendo cada vez mais subjetividade e injustiça para o processo de seletivo.
#2 Critérios e pesos de características pessoais
O processo de seleção funciona como um funil e a triagem de currículo é um dos filtros iniciais. Essa triagem é feita por meio de critérios pré-estabelecidos por recrutadores na própria plataforma, em que podem adicionar estes critérios e alterar determinada pontuação. “Sabemos que os recrutadores podem adicionar pontuação maior, por exemplo, para quem possui um nível avançado de idioma ou uma pontuação extra para quem fez intercâmbio ou já teve alguma experiência prévia”, aponta Rana.
Esse processo agiliza a triagem, que antes era feita por meio de análises de currículos até mesmo impressos. Nesta etapa, a configuração dos critérios da empresa na plataforma é fundamental, mas também é aqui que podem nascer outras fontes de subjetividade, ou vieses, como o RH costuma chamar. “Estamos falando de plataformas que permitem adicionar pesos diferentes para pessoas de um determinado gênero ou etnia, o que é algo bem grave. Até mesmo esquecer de adicionar pontuação para um determinado curso ou universidade, pode ser um ponto crítico no processo seletivo”, afirma ele.
#3 Robôs que não entendem 100% dos currículos
Outro ponto relevante da IA é a leitura de arquivos (.doc, .pdf, entre outros) para compilar as informações em sistemas de maneira organizada para facilitar análise de dados. Os algoritmos muitas vezes não conseguem compreender determinados itens, como quando os candidatos inserem informações de idiomas utilizando elementos gráficos de bolinhas ou barras e não as palavras tradicionais “básico”, “intermediário”, “avançado” ou “fluente”. Essa falta de interpretação por parte do robô pode descartar candidatos com alto potencial apenas por uma falha do sistema.
#4 Diversidade de poucos clusters
A principal função do machine learning é a categorização, em que o sistema usa padrões e é retroalimentado para aprender e assim classificar, geralmente em grupos (clusters). Daí é que o quesito diversidade pode não ser contemplado. Se não forem abastecidas corretamente, as plataformas não entregaram os candidatos genuinamente diversos ou são poucos clusters que foram encontrados nos padrões da inteligência artificial. “Se internamente os gestores não forem bem instruídos ou compreenderem na totalidade a cultura da empresa, as contratações do presente dirão muito sobre as contratações do futuro, afetando diretamente o desejo da empresa de implantar diversidade como estratégia e valor para o negócio”, indica o especialista.
A Dinâmica Treinamentos buscou saber a visão de consultores do mercado de tecnologia de AIaaS sobre estes desafios. “Estes erros podem acontecer, mas em processos totalmente manuais também. Cabe totalmente as plataformas criarem artifícios para garantir que os dados de entrada cheguem corretamente, como evitar casos de testes realizados em grupo. Ter dados corretos são os pontos-chave para usar na tomada de decisão em um processo seletivo eficiente”, afirma Daniel Omar, consultor especializado em Inteligência Artificial.
Lucas Rana conclui que o RH deve atuar de maneira direta e garantir maior assertividade e justiça com os candidatos. “Como é o caso do processo seletivo da P&G e Tenaris, onde as provas de lógica e inglês ocorrem presencialmente, embora sejam soluções não escaláveis. Apesar de diversos pontos de melhoria, cada vez mais a IA deve ser atrelada ao RH e processos internos das empresas, tornando-os cada vez mais ágeis e tirando das mãos humanas trabalhos operacionais que não agregam valor”.
Fonte: ADS Comunicação Corporativa